A deputada federal Maria do Rosário (PT-RS) prestou depoimento hoje (23) pela manhã no Supremo Tribunal Federal (STF) como testemunha em duas ações penais (AP 1007 e AP 1008) contra o deputado Jair Bolsonaro (PSC-RJ) por incitação ao crime de estupro e injúria. Em 2014, o deputado afirmou na Câmara dos Deputados e em seguida em entrevista ao jornal Zero Hora, que a deputada Maria do Rosário não merecia ser estuprada, porque ele a considerava “muito feia”.
O advogado Cezar Britto, ex presidente da Ordem dos Advogados do Brasil que compõe a equipe do escritório Cezar Britto & Advogados Associados e que representa Maria do Rosário, acompanhou o depoimento que durou cerca de 1 hora. Para Britto é importante esclarecer que o processo ainda está em fase de instrução, porém ganha “força e celeridade” com a recente decisão do Superior Tribunal de Justiça que condenou, na semana passada, Bolsonaro a retratação por danos morais e indenização no valor de R$ 10 mil a ser paga à deputada Maria do Rosário. Serão ouvidas ainda testemunhas e também o próprio réu antes do ministro Luiz Fux, relator das ações penais, levar a decisão para a Primeira Turma do STF.
Cezar Britto relatou que durante o depoimento a deputada se emocionou várias vezes e que contou o verdadeiro “calvário” que vem vivendo desde que o deputado Bolsonaro proferiu as ofensas a ela. “Para vocês terem uma ideia, só com a condenação do STJ na semana passada, Maria do Rosário já recebeu via redes sociais mais de 9 mil ofensas de pessoas que acreditam que o deputado Bolsonaro estava correto em lhe injuriar e ofender. Fica claro que este parlamentar incita o ódio em seus seguidores virtuais e abre um precedente perigoso para que homens acreditem que mulheres “merecem” ser estupradas. Isto é de uma crueldade sem fim e a vítima da ofensa continua sendo ofendida diariamente, cotidianamente”, alertou Britto.
O advogado argumenta que é necessário esclarecer que “o deputado Bolsonaro agiu premeditadamente para se esconder sob o manto da chamada imunidade parlamentar”. Segundo Cezar Britto, a primeira ofensa de Bolsonaro a Maria do Rosário foi em 2003, mas se passaram 11 anos até que o deputado proferisse nova ofensa em 2014, desta vez no Plenário da Câmara dos Deputados, para supostamente revidar a acusação de que a deputada o teria chamado de estuprador. “Ora, a deputada jamais lhe chamou de estuprador, e o lapso temporal que ele faz entre um fato e outro, os aproximando como se fossem acontecimentos próximos em vídeos editados divulgados nas redes sociais é uma maneira de premeditar a sua nova e injuriosa agressão e dizer que era portador de um absurdo habeas corpus preventivo para livre agredir a quem desejar, pois estava dentro do ambiente parlamentar. Incitando desta maneira, a prática do crime de estupro, dizendo que se fosse estuprador, jamais estupraria a deputada por ela não merecer. O próprio termo merecer é um termo escolhido a dedo e que atinge profundamente as vítimas de estupro que se culpam e se perguntam o que fizeram para merecer serem estupradas”, lembrou.
Ao sair do depoimento, acompanhada pelas deputadas Erika Kokay (PT-DF), Luiza Erundina (PSOL-SP) e Benedita da Silva (PT-RJ) e ativistas de movimentos feministas que lutam pelo fim da violência contra as mulheres, Maria do Rosário desabafou: “Estamos aqui para que se faça justiça diante de toda a incitação ao crime. Qualquer pessoa hoje no Brasil e, sobretudo as mulheres, estão sujeitas a todo tipo de ataque. O pronunciamento desse parlamentar gerou uma onda de ódio imensa, que não apenas atinge a minha pessoa, mas atinge muitas mulheres pelo Brasil”.