A Polícia Federal de Passo Fundo, no Rio Grande do Sul, instaurou inquérito policial contra 10 defensores e defensoras de Direitos Humanos que apoiam causas e direitos dos povos indígenas. A acusação é de denunciação caluniosa e/ou comunicação falsa de crime, artigos 339 e 340 do Código Penal. Para conter a medida arbitrária do delegado da Polícia Federal, Eduardo Brum Souza, o escritório Cezar Britto & Advogados Associados apresentou um Habeas Corpus, de nº 5004491-09.2017.4.04.7117/RS, na Justiça Federal de Erechim.
Segundo o juiz federal substituto, Joel Luis Borsuk, que analisou o HC, o IPL nº 50020574720174047117 instaurado em maio deste ano não continha sequer indiciados, e apesar de indeferir a medida liminar, fez constar que “por óbvio, a solicitação dirigida ao próprio paciente (ou seja, ao defensor que encabeça a peça jurídica) pode não ser respondida por ele se reputa ilegal a determinação”. Desta forma, o advogado não tem obrigação de prestar informações, se ilegal, à autoridade policial. O juiz também determinou que houvesse manifestação formal do Ministério Público Federal em relação ao inquérito.
“Acredito que a decisão do juiz, embora negando a liminar, vem no sentido de salvaguardar a prerrogativa dos defensores que são advogados dos indígenas. Pois é necessário esclarecer que houve abuso por parte da autoridade policial na abertura de um inquérito para investigar exatamente os denunciantes das violações cometidas pela polícia contra os indígenas. Ou seja, os defensores foram qualificados praticamente como investigados. Além disto, houve constrangimento para que um dos defensores fornecesse ao delegado suas fontes de informação. Houve também: monitoramento de dados das redes sociais e ameaças de que que seriam feitas busca pessoal na casa do defensor, independente de mandado judicial, o que é expressamente vedado pelo Estatuto da Advocacia”, explica o advogado Paulo Freire, da equipe de advogados do escritório Cezar Britto & Advogados Associados, que é um dos impetrantes do remédio constitucional.
Segundo Emiliano Maldonado, advogado membro da Rede Nacional de Advogados e Advogadas Populares do Rio Grande do Sul e que também é autor do HC, “a investigação criminal de advogado no exercício das suas funções é medida excepcional, devendo ser aplicada de forma cuidadosa, sob a possibilidade de estar-se constrangendo o exercício legal da profissão e as suas prerrogativas funcionais”.
Na sentença, o juiz permitiu que o Poder Judiciário local forneça os números dos processos, bem como a chave de acesso dos mesmos, à autoridade policial. Decisão que o advogado Maldonado considera delicada, pois pode expor informações dos defensores sobre seus clientes.
Entenda o caso:
Defensores e defensoras, em conjunto com Comissão de Direitos Humanos de Passo Fundo e com o Conselho Indigenista Missionário da Região Sul, receberam em 2016 a denúncia de graves violações de direitos humanos cometidas em operação realizada pela Brigada Militar do Estado do Rio Grande do Sul e pela Polícia Federal, no cumprimento de mandados de prisão preventiva contra integrantes da tribo Kaingang.
A operação policial teria sido realizada com uso imoderado da força policial, sem critérios de abordagem por parte do comando policial, em ação desproporcional, abusiva e vexatória, sendo utilizadas armas de bala de borracha e obrigando indígenas, incluindo idosos, crianças e deficientes físicos, a ficarem deitados em um pavilhão com o rosto no chão. A ação policial foi deflagrada com autorização do Juízo da Comarca de Sananduva, município do Rio Grande do Sul.
Em maio deste ano, o delegado da Polícia Federal, Eduardo Brum Souza, instaurou um inquérito policial para investigar a conduta dos defensores no caso.